RESTINGAS E MANGUEZAIS: STF MANTÉM A PROTEÇÃO
STF confirma uma tendência geral da corte em optar pela maior proteção em caso de dúvida fundada sobre os efeitos de mudanças normativas
Por Paulo de Bessa Antunes*
Foi formada maioria, no plenário do STF, no julgamento da ADPF 747, com vistas à manutenção da liminar concedida pela Ministra Rosa Weber que suspendeu os efeitos da Resolução 500 do Conama que, dentre outras coisas, revogava as Resoluções 302 e 303 do mesmo conselho. A decisão da corte é relevante por diversos motivos.
Inicialmente, há que se observar que não há inovação no tema, pois na maioria das vezes em que as Resoluções 302 e 303 foram submetidas ao crivo judicial, o Judiciário atestou as suas legalidades, mesmo após a vigência do novo código florestal. É verdade que a doutrina se achava dividida em relacao ao tema. Logo, a decisão pacifica a questão, o que amplia a tão necessária segurança jurídica, não tendo havido qualquer mudança no quadro legal vigente.
Em segundo lugar, não há prejuízo para os necessários projetos de infraestrutura, pois aqueles considerados de utilidade pública e/ou interesse social possuem waiver legal, podendo ser afastada a proteção para as suas implantações, obsevadas as compensações legais.
Em terceiro lugar, ainda que a matéria não esteja diretamente envolvida no caso concreto, cabe indagar se, à luz do inciso III, do parágrafo 1 do artigo 225 da Constituição Federal, se não seria o caso de lei para alterar as dimensões da proteção concedida pelas Resoluções revogadas, pois não há dúvida de que as restingas e os manguezais são espaços territoriais especialmente protegidos [ETEP].
A propósito, no debate sobre a legalidade da criação do Parque Nacional, da Ilha Grande (Paraná), suscitada pela Colônia de Pescadores Z 13, a 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região [TRF 4] , entendeu que “o parque nacional foi criado em conformidade com a legislação vigente na época, que permitia a criação por decreto executivo”, sendo válido o ato de criação e que, somente por lei específica é que poderia ser alterada sua destinação ou ser extinta a unidade de conservação. O Relator, Desembargador Leal Junior, acrescentou que nem a caducidade da declaração de utilidade pública nem a demora do Poder Público em desapropriar todas as áreas que integram a unidade de conservação implicariam extinção da unidade de conservação. “Do contrário, teríamos uma situação paradoxal: o Poder Executivo não poderia agir e editar um decreto para revogar a implantação daquele parque nacional (um fazer), mas poderia alcançar esse objetivo mediante a simples omissão (um não-fazer)” .
Veja-se, também, que O STF tem decidido que medidas provisórias não podem alterar os ETEP. [ADI 4.717, rel. min. Cármen Lúcia, j. 5-4-2018, P, DJE de 15-2-2019.]. Assim, parece claro que, no entendimento do Poder Judiciário, há um longo caminho a ser percorrido para a alteração de ETEP, com forte reserva de lei.
Por fim, a maioria formada no STF confirma uma tendência geral da corte em optar pela maior proteção em caso de dúvida fundada sobre os efeitos de mudanças normativas. Há uma lição importante a ser aprendida que é entender como o tribunal delibera. As meras convicções pessoais sobre este ou aquele tema são insuficientes para perceber o posicionamento da corte. Caso o mérito seja julgado em favor da anulação da Resolução 500 do Conama, que o Executivo perceba que a proteção ambiental no Brasil tem um importante componente que é o sistema de justiça e que é fundamental conhecer como ele funciona e decide.
*Paulo de Bessa Antunes é Advogado, Professor Associado da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, foi Procurador Regional da República – Ministério Público Federal por trinta anos. É presidente da União Brasileira dos Advogados Ambientais – UBAA
Fonte: The Eagle View
Publicação Ambiente Legal, 30/11/2020
Edição: Ana A. Alencar