Os Embargos de Declaração e o Efeito Modificativo: Infelizmente a exceção transforma-se ‘pontualmente’ em regra
Por Bruno Campos Silva*
Os embargos de declaração, típica espécie recursal, de fundamentação vinculada, possui nítida função constitucional de aperfeiçoar o ato decisório (qualquer decisão judicial – ex vi do art. 1.022, caput, CPC).[1]
As hipóteses de cabimento do referido recurso estão enumeradas no art. 1.022, I, II e III, CPC – além da hipótese da omissão qualificada prevista no seu parágrafo único – com remissão ao art. 489, § 1º, CPC -, e, para operacionalizar o efetivo aperfeiçoamento do ato decisório, com a eliminação do vício apontado pela parte recorrente, deve-se demonstrar a inconteste existência do vício, sob pena de se negar provimento ao pedido recursal, eis que o vício encontra-se inserido no mérito.
Quando se fala em admissibilidade de qualquer recurso, deve-se ter em mente a presença ou não de requisitos internos ou externos (intrínsecos ou extrínsecos, nos dizeres do saudoso José Carlos Babosa Moreira) – p. ex., cabimento, preparo -.
O que se tem observado, infelizmente, na prática forense, é uma distorção relativa à presença dos vícios, especialmente aquele inerente à contradição.
Ora, a contradição pelo próprio sentido da palavra indica a presença de incongruência interna à decisão acoimada pelo vício.
Não se deve entender por contradição, vício apto a veicular a interposição dos embargos declaratórios, e, também, capaz de provocar a modificação do que restou anteriormente decidido, aquela considerada como incongruência entre a decisão e elementos externos.
O Estado-juiz, ao analisar o mérito do recurso, deverá constatar se a contradição apontada pela parte recorrente é interna ou não, eis que elementos externos ao julgamento não devem ser levados em consideração, por exemplo, cotejo de provas, peças das partes e outras decisões externas. Deverá fundamentar a sua decisão (ex vi do art. 93, IX, CF/88 e art. 489, CPC) com a exata delimitação do vício, e não com auxílio de elementos externos e subjetivismos (ou até mesmo elementos metajurídicos!), os quais deslegitimam a sua própria decisão numa perspectiva de Estado Democrático de Direito, cuja imparcialidade e necessária fundamentação são ingredientes à própria jurisdição.
Não é demais recordarmos que os embargos de declaração não servem para fazer justiça, ou seja, para provocar a imediata alteração da decisão anteriormente proferida, mas, como regra geral, apenas aperfeiçoar o ato decisório, para cumprir o disposto no art. 5º, XXXV, CF/88.
O que se vê, na prática, é o uso indiscriminado de embargos de declaração, com intuito meramente protelatório e, ainda, decisões “políticas” (pontuais) que, por certo, desconfiguram a real função do mencionado recurso, em total afronta ao Estado de Direito.
Notas e Referências
[1] Ensaio publicado no Informativo do dia 30.10.2020 da Moisés Freire Advocacia.
*Bruno Campos Silva – Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Especialista em Direito Processual Civil pelo CEU-IICS-SP. Professor de Direito da Fupac-Unipac – Uberaba-MG. Ex-Professor de Direito Processual Civil do Centro de Ensino Superior de São Gotardo-MG (CESG). Especialista em Mercado de Carbono pela Proenco-SP. Coordenador e coautor de obras coletivas nas áreas do Direito Ambiental e Urbanístico. Membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública – IBAP. Membro da Academia Latino-Americana de Direito Ambiental – ALADA. Membro da União Brasileira da Advocacia Ambiental – UBAA. Advogado, coordenador das áreas cível e ambiental da Moisés Freire Advocacia. E-mail: brunocamposadv@outlook.com
Fonte: Empório do Direito pelo próprio autor
Publicação Dazibao: 16/11/2020
Edição: Ana A. Alencar