O melhoramento genético no agronegócio da cana-de-açúcar
Por Jorge Brunetti Suzuki
A agricultura é um setor de enorme relevância para o desenvolvimento humano. Segundo o panorama global de hoje, é claro que o suprimento de alimentos não é adequado para os seis bilhões de habitantes do planeta, e, mesmo com os esforços previstos na Agenda 21 para políticas demográficas racionais, a população deverá atingir nove bilhões em algumas décadas. Dentro dos conceitos da “revolução verde”, incluindo o uso intensivo de insumos e de água, a sustentabilidade da agricultura ainda é uma questão aberta.
Parte da solução desse dilema está no uso adequado dos fatores de produção. Busca-se a todo o tempo soluções que otimizem todo o sistema, citando-se as medidas contra queimadas, a redução de impacto ambiental em novas áreas e manutenção da biodiversidade em locais de plantio, o combate à erosão e as atividades de pesquisa voltadas ao desenvolvimento de variedades ambientalmente viáveis que auxiliem no aumento da produtividade.
Importante ressaltar que qualquer intervenção na natureza e em organismos vivos implica escolha de alternativas selecionadas em função dos objetivos traçados sobre as incertezas existentes no entorno dessas opções.
No Brasil, o panorama atual mostra que o setor apresenta um significativo desenvolvimento da biotecnologia de cana-de-açúcar. O país se destaca, juntamente com Austrália e África do Sul, no emprego desta tecnologia nos programas de desenvolvimento de variedades.
Extremamente relevante foi o desenvolvimento do projeto Genoma Cana, financiado pela Copersucar e FAPESP, entre os anos de 2000 e 2003. O projeto descreveu quase trezentas mil seqüências genéticas expressas em cana que, analisadas, foram agrupadas em aproximadamente 40 (quarenta) mil genes.
Neste patrimônio genético, foram descritos genes relacionados à resistência a doenças, resposta a estresse, metabolismo de nutrientes, metabolismo de carboidratos, fatores de transcrição, processo de florescimento e outros. Alguns grupos de pesquisa já utilizam estes genes em programas de melhoramento genético, que são técnicas de obtenção de espécimes com características desejadas induzidas pelo cruzamento de organismos naturais, normalmente cultivadas em viveiros específicos.
Ainda, a continuidade do projeto Genoma Cana aponta promissoramente para o desenvolvimento de variedades mais resistentes a pragas e doenças, além de alguns estresses importantes, como seca e frio, que poderiam, até, estimular a expansão da cultura em regiões hoje consideradas inaptas.
Algumas indefinições e a complexidade da legislação brasileira que rege os trabalhos de pesquisa e desenvolvimento de transgênicos configuram o grande obstáculo atual. Para o plantio de um campo experimental de cana transgênica, há necessidade da aprovação do projeto em diversos órgãos ambientais, em ritos autônomos e subseqüentes, e não há definição clara sobre o protocolo a ser seguido para o registro do produto final para uso comercial.
Além de encontrar-se na vanguarda mundial da biotecnologia de cana, merece amplo destaque a postura adotada pelos atores envolvidos com a biogenética da cana no Brasil, que recorreram a estudos e experimentações anteriores ao requerimento de liberação comercial das espécies desenvolvidas.
No panorama ambiental que se encontra o planeta, permeado de situações críticas e graves incertezas, lutar pela liberação de um organismo cujas conseqüências reais que acarretaria ao meio ambiente e à saúde humana seria agir com a mesma irresponsabilidade que adotam diversos setores e grupos econômicos.
Ao contrário, é louvável a postura da agroindústria canavieira nacional, que adota técnicas de melhoramento genético natural, enquanto promove os estudos e debates necessários para que sejam desenvolvidas espécies transgênicas condizentes com os conceitos de sustentabilidade e prevenção ambiental. Tal fato configura um importante elemento para um setor que hoje possui imenso destaque mundial político e econômico.
Jorge Brunetti Suzuki é advogado associado ao Escritório Pinheiro Pedro Advogados. Atua na Área de Direito Ambiental.
E-mail: jorge@pinheiropedro.com.br