Na Argentina é que se vê a tragédia do turismo no Brasil
Na Volta para Casa, a Inevitável Comparação
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro*
Viajar nos informa sobre a precariedade de nossas políticas governamentais para o turismo e nossa falta de cultura mercadológica. Observando como os países se estruturam para bem receber os turistas, compreendemos com tristeza a mediocridade de nossa preparação.
O exemplo argentino já nos bastaria.
Gosto de ir para a Argentina. De Ushuaia a Buenos Aires, nada se perde naquele país. Por mais que se observe as impressionantes variações de humor político e situação econômica ocorridas nas últimas duas ou três décadas, o fato é que o orgulho nacional prevalece e a cultura cada vez mais se afirma.
O espírito de nação está presente nas ruas, nos monumentos bem cuidados, nas praças magnificamente bem desenhadas, na arquitetura de ontem e de hoje, na cor azul estampada nos uniformes, giroflex e placas indicativas, nas livrarias e cafés, no profissionalismo expresso nos espetáculos de tango, na cozinha e até nas feiras de rua.
A Argentina recebe, e bem, 6,5 milhões de turistas por ano – o mesmo número de turistas que aporta ao Brasil. Sua capacidade geográfica, humana e social, no entanto, é pelo menos três vezes menor que a nossa. Vale dizer: proporcional e numericamente, o destino turístico mais importante da América do Sul ainda é Buenos Aires – nunca foi o Rio.
A maior atração turística austral é sua própria gente, para além das paisagens andinas, patagônicas, áridas e da beleza de sua capital. São as pessoas, a cultura, a música e a gastronomia bem servidas, generosa e orgulhosamente preservadas – a principal atração portenha, patagônica e do oeste argentino.
Houvesse no Brasil, um mínimo de interesse em desenvolver o turismo como há na Argentina, e nossa indústria simplesmente triplicaria. No entanto, não é o que aqui ocorre.
Por aqui já houve governador que sugeriu esconder as favelas com outdoors para a Copa do Mundo, políticos “gestores” que já venderam a bunda de nossas mulheres como atração turística nacional – sem qualquer conotação outra que não o comércio do sexo – administradores que transformaram a empresa brasileira de turismo em bolsa de pontuação corrupta de hotéis de luxo, idiotas que reduziram o turismo ao samba carnavalesco ou destruíram praias inteiras para alocar barracões de axé em cidades francamente decadentes.
Enquanto isso, o saneamento continua inexistente, as cidades continuam decaindo urbanisticamente, os monumentos permanecem todos dilapidados, a memória nacional resume-se ao criticismo esquerdobobo quando não totalmente ignorado, índios continuam seminus vendendo miçangas na calçada, etc.
Para piorar… ainda possuímos os mais obtusos operadores do direito em matéria ambiental. Gente incapaz de aprender para que serve uma marina, não difere um resort de um loteamento, prefere a favelização irregular á urbanização saneadora, desconhece esportes de natureza, desconfia de seres humanos em unidades de conservação… Enfim, burocratas que destroem o que pode dar certo e impedem o fluxo de investimentos – e ainda dizem que estão defendendo o meio ambiente (com certeza o deles próprios – pois vivem do conflito que criam). Assim ocorre, contudo, porque não há planejamento de Estado, não há vontade política e não há gestão efetiva governamental.
Nossa administração possui quatro organismos de controle para cada um de execução. Ou seja, por aqui, se o executor não for administrativamente executado, com certeza sua obra terminará judicializada.
Triste Brasil, que não sabe o que é uma indústria de turismo, desconhece o valor da preservação da cultura, despreza suas cidades, não conserva os seus centros urbanos, desfaz do seu povo, desprestigia sua culinária, ignora seus heróis e personagens históricos e cultiva com afinco a mais desprezível mediocridade.
Quem sabe, um dia, ainda iremos acordar para este fato deprimente.
Espero que, nesse dia, ainda tenhamos o que mostrar ao mundo.
*Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API. Foi presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB/SP, da Câmara Técnica de Legislação do CEBDS, do Comitê de Meio Ambiente da AMCHAM, consultor do governo brasileiro, do Banco Mundial, da ONU e vários outros organismos encarregados de aperfeiçoar o arcabouço legal e institucional do Estado no Brasil. Integrou o grupo encarregado de elaborar o plano de transição do governo Bolsonaro no campo ambiental. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.
Fonte: The Eagle View