DILEMAS DO SEGUNDO MÊS
Por Roberto Luciano Fagundes
A queda de Eduardo Cunha no Conselho de Ética da Câmara Federal, primeiro passo para sua quase certa cassação definitiva, é boa ou ruim para o governo provisório de Michel Temer? Há, sem dúvida, certo alívio no Palácio do Planalto com a quebra da sua capacidade de influir politicamente, mas, ao mesmo tempo, uma grande preocupação quanto ao que poderá emergir desta confusão, que tende a se acentuar com a ciclotimia do presidente do Senado, que ora apoia, ora atrapalha o governo, e, agora, com as denúncias do ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, que acabam de respingar em Temer. Este segundo mês de mandato promete…
Cunha é sempre um perigo, seja como amigo ou inimigo. Ajudou bastante na instalação do governo provisório, mas apenas porque o afastamento da presidente da República era parte fundamental de seus planos. Mas pode também prejudicar, e muito: ele tem no bolso uma fatura pelo serviço, pronta para ser oportunamente apresentada, e, mesmo na prisão, de que parece estar cada vez mais próximo, continuará a exercer o atemorizante poder que decorre de saber de muita coisa e de não estar disposto a cair sozinho. É exatamente aí que parecem se concentrar os maiores receios do governo de transição, que acabou por se abrigar sob um telhado de vidro quando, ao buscar o imprescindível apoio parlamentar, precisou fazer vista grossa a algumas reputações, digamos, duvidosas. Com uma Polícia Federal, um Ministério Público e um Judiciário que não se intimidam e que quase diariamente trazem à luz novos fatos, novos nomes – alguns inimagináveis –, novos indiciamentos e prisões, tudo é possível.
Mas nem tudo vai mal. Ao fim do primeiro mês do novo governo, a escolha da equipe econômica, incluídos aí os novos presidentes das empresas estatais, já era reconhecida, particularmente pelo mercado, como irretocável. As primeiras mudanças, como as que estabeleceram a nova meta fiscal e o contingenciamento de gastos já foram aprovadas pelo legislativo, sendo recebidas positivamente pelo setor produtivo, que até já demonstra certo otimismo, resultante de algumas melhoras em indicadores econômicos e fiscais, como a inflação levemente declinante e a igualmente pequena redução da dívida pública.
Contudo, não é possível afirmar que esta leve mudança de humor seja uma tendência, pois há nuvens à frente: apesar da aprovação parlamentar às primeiras reformas terem avançado com certa facilidade, elas, apesar de extremamente importantes, não são medidas que influam nem direta nem imediatamente no bolso dos brasileiros. São, digamos assim, intenções, diretrizes a serem seguidas. Mas o que acontecerá quando as reformas chegarem à criação de novos tributos, ao aumento daqueles já existentes, às leis trabalhistas, à Previdência Social?
Felizmente, até agora, os brasileiros parecem estar dando um voto de confiança a Temer, embora não o manifeste explicitamente. Pelo que se viu nas poucas e pífias manifestações de rua contrárias ao presidente, não há ainda motivo de grandes preocupações para o governo – que a elas, aliás, reagiu com absoluta indiferença. No Congresso, a postura dos partidos hoje na oposição é a que deles se poderia esperar: muita gritaria, muita cara feia, nenhuma argumentação racional – apenas a habitual ortodoxia ideológica, o anacrônico sectarismo, uma barulheira inócua. O que pode realmente ser danoso acontece entre os aliados: o velho fisiologismo.
Resta saber, porém, até quando vigorará este armistício informal, pois a população não está nem um pouco satisfeita. Os preços crescem incessantemente, o consumo está em queda, a chamada “nova classe média” viu se esvaírem suas conquistas (algo que já vem de mais tempo) e retrocedeu ao antigo patamar. O mais preocupante, porém, é o desemprego: está em 11% e deve chegar, logo, logo, aos 14%, uma situação impossível de se reverter pelo menos nos próximos dois anos, segundo preveem economistas.
O Brasil, enfim, vive um momento extremamente difícil – na política, na economia, nas próprias dúvidas dos brasileiros quanto ao futuro. Mas pior do que era não fica: temos hoje um governo que manifestamente quer acertar e, para isso, precisa de apoio. Está ruim, mas já pensaram se Dilma voltar?
Roberto Luciano Fagundes, engenheiro, vice-presidente da Federaminas, Presidente do Conselho do Instituto Sustentar e Presidente do Conselho Curador da Fundação BH Turismo e Eventos