A regulação da microgeração e minigeração de energia no Brasil

Guilherme Crispa Ursaia em Skanderborg, Dinamarca (2012)

Guilherme Crispa Ursaia em Skanderborg, Dinamarca (2012)

 

Por Guilherme Crippa Ursaia*

A microgeração e minigeração de energia elétrica já está consolidada em alguns países europeus há mais de 20 anos, assumindo, a cada dia, um novo papel no setor elétrico, passando de uma atividade centralizada e de exclusividade de grandes e médios grupos empresariais para uma atividade cada vez mais democrática em que até indivíduos podem assumir o papel de um microgerador de energia elétrica.

A experiência na Europa

Tenho estudado o tema e suas aplicações desde 2009, tomando por base os modelos existentes na Europa e países escandinavos. Nesse mesmo ano fui convidado a trabalhar no Folkecenter for Renewable Energy (www.folkecenter.net), na Dinamarca onde tive a oportunidade de conhecer profundamente este modelo que já está solidificado e sendo utilizado pela maior parte da população – a geração distribuída de energia, baseada em fontes renováveis e sistemas combinados, como solar, eólica, biomassa e biogás.

Em 2012 fui convidado a fazer um curso em uma empresa especializada na confecção e instalação de projetos de energia solar fotovoltaica para residências e empresas (www.solarpanels.dk), utilizando o programa mais avançado do mundo, chamado PVSol.

A legislação escandinava prevê a utilização de energia renovável como prioridade, devido à segurança energética e combate as mudanças climáticas, incentivando os consumidores a produzirem a sua própria energia, trazendo o conceito de zero energy costs home, ou seja, um lar totalmente autossuficiente em energia.

Na Dinamarca, os proprietários de residências optantes pelo sistema fotovoltaico fazem o dimensionamento das placas no montante exato de seu consumo, já que a lei não permite a geração de crédito. Assim, a energia produzida é jogada na rede distribuidora, e, a utilizada, compensada, tendo o consumidor nada a pagar ao final do mês.

Este sistema tem a vida útil de aproximadamente 30 anos e a expectativa de retorno do investimento gira em torno de 6 anos.

A regulação no Brasil

O Brasil é o terceiro país com maior insolação entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, por este motivo, deter conhecimento da atividade solar e propiciar as bases necessárias para o desenvolvimento dessa indústria constitui uma necessidade e vocação natural para o país.

Seguindo esta tendência, em 17 de abril de 2012, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) aprovou a Resolução n°482/2012, estabelecendo as condições gerais para o acesso de microgeração e minigeração distribuída aos sistemas de distribuição de energia elétrica, assim como o sistema de compensação de energia elétrica.

O sistema de microgeração e minigeração distribuída serão denominados como centrais geradoras de energia elétrica, com potência instalada menor ou igual a 100 kW para o primeiro, e, superior a 100 kW e menor ou igual a 1 MW para o segundo e que utilize fontes com base em energia hidráulica, solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, conectada na rede de distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras.

É criado também o sistema de compensação de energia elétrica, no qual a energia ativa gerada por unidade consumidora com microgeração distribuída ou minigeração distribuída compense o consumo de energia elétrica ativa.

Pelo sistema, a unidade geradora instalada em uma residência, por exemplo, produzirá energia e o que não for consumido será injetado no sistema da distribuidora, que utilizará o crédito para abater o consumo dos meses subsequentes. Os créditos poderão ser utilizados em um prazo de 36 meses e as informações estarão contidas na fatura do consumidor.

O alcance da regra

As empresas e órgãos públicos que optarem por participar do sistema de compensação também poderão utilizar o excedente produzido em uma de suas instalações para reduzir a fatura de outra unidade.

O consumidor que instalar micro ou minigeração distribuída terá de arcar com os custos de adequação do sistema de medição necessário para implantar o sistema de compensação. Após a adaptação, a própria distribuidora será responsável pela manutenção eventuais custos de substituição.

A regra é direcionada a geradores que utilizem fontes renováveis de energia, denominada de “geração distribuída”. A geração de energia elétrica próxima ao local de consumo ou na própria instalação consumidora trará uma série de vantagens sobre a geração centralizada tradicional, como, por exemplo, economia dos investimentos em transmissão, redução das perdas nas redes e melhoria da qualidade do serviço de energia elétrica.

Ao contrário do que tem sido veiculado na mídia, a microgeração de energia elétrica não será uma ameaça às concessionárias, e muito menos à segurança da rede, mas sim uma importante ferramenta para redução de perdas e melhoria da qualidade da energia e na gerência da rede, aliada ao conceito smart grid permitindo ao gerenciadores de redes prover controle da carga dos clientes conectados, bem como de suas unidades geradoras, obtendo assim o melhor aproveitamento da rede elétrica em todos os sentidos.

Haverá assim consequentemente a viabilização de diversas novas tecnologias hoje ainda em fase experimental nas diversas universidades brasileiras e centros de pesquisa, culminando com o desenvolvimento de equipamentos e na prestação de serviços necessários para gerenciamento e uso da mini e microgeração.

Empresários e integrantes do setor afirmam que a medida não é suficiente para impulsionar a instalação de painéis solares, já que o custo de financiamento para pessoas físicas e pequenas empresas é muito alto no país. Além disso, criticam o fato de o consumidor ter que pagar a tarifa de disponibilidade para as distribuidoras mesmo que produzam toda a energia que consomem, o que tornaria a geração menos vantajosa.

Paralelamente ao sistema de compensação de energia, a ANEEL aprovou novas regras para descontos na Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e na Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) para usinas maiores, de até 30 MW, que utilizarem fonte solar:

a) Para os empreendimentos que entrarem em operação comercial até 31 de dezembro de 2017, o desconto de 80% será aplicável nos 10 primeiros anos de operação da usina;

b) o desconto será reduzido para 50% após o décimo ano de operação da usina;

c) para os empreendimentos que entrarem em operação comercial após 31 de dezembro de 2017, mantém-se o desconto de 50% nas tarifas (PG/DV/HL/DB).

Aponto alguns benefícios na utilização da mini e microgeração:

– redução da emissão de carbono, utilizando fontes de energia renováveis ao invés de combustíveis fósseis, ajudando a combater os efeitos da mudança climática;

– utilizar fontes de energia renováveis não esgota os recursos naturais da Terra;

– usa recursos livremente disponíveis, tais como o vento e o Sol e os custos de energia de modo geral podem ser reduzidos brutalmente;

– você provavelmente será menos afetado por flutuações de preços de energia;

– calor e electricidade podem ser gerados no mesmo processo, no ponto de utilização;

– promove a diversidade em um mercado de energia competitivo, uma vez que há menos dependência de grandes empresas de energia, garantindo que a energia acessível está disponível para todos, incentivado os usuários a pensar e usar a sua própria energia e educar outras pessoas;

– a indústria cresce gerando muitas oportunidades de emprego;

– no Brasil, o investimento em um sistema básico de placas fotovoltaicas tem seu retorno em aproximadamente 6 anos, tendo uma vida útil de 30 anos, ou seja, após o período de amortização o utilizador não terá nenhum custo de energia.

Para que esta tendência se solidifique e tome um rumo sustentável no País, precisamos de políticas públcias claras, firmes e estáveis, além de uma abordagem de longo prazo para apoiar de forma transparente a microgeração e o desenvolvimento de novas tecnologias.

 

*Guilherme Crippa Ursaia é Advogado associado ao escritório Pinheiro Pedro Advogados. É Auditor Líder Ambiental – ISO 14001 pela Bureau Veritas, tendo trabalhado no Folkecenter for Renewable Energy, Solar Panels, na Dinamarca e Center for Alternative Technologies – CAT em Wales – UK. É membro da Comissão de Meio Ambiente e da Comissão de Energia da Ordem dos Advogados do Brasil – Subseções de Santa Catarina e São Paulo.


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