A aplicação da Lei Tributária do ISS e as disposições relativas à Improbidade Administrativa na Tributação

Texto que trata da aplicação da Lei Tributária do ISS e as disposições relativas à Improbidade Administrativa na Tributação.

 

antifraude

 

Por Fábio Pugliesi*

 

Neste artigo analisar-se-ão as disposições da Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB relativas à concessão de benefícios fiscais e à tributação do ISS pelos Municípios, as disposições da lei de improbidade administrativa na tributação, a relação entre ordens jurídicas no federalismo fiscal, as disposições relativas à interpretação no Código Tributário Nacional e a definição de sentido dos textos normativos municipais relativos ao ISS.

A Lei Complementar no 116/2003, editada pelo Congresso Nacional em 31/07/2003 e alterações posteriores, prescreve os serviços a serem tributados pelo Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza  – ISS por lei municipal e do Distrito Federal, uma vez que este exerce a competência tributária atribuída aos Municípios, segundo o disposto no inciso III do artigo 156 da Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB.

Por sua vez o inciso III do parágrafo terceiro do artigo 156 da CRFB atribui à lei complementar a forma e as condições, incentivos e benefícios fiscais que, no âmbito do ISS, podem concedidos e revogados.

Aliás o parágrafo sexto do artigo 150 da CRFB determina textualmente que qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição,

A lei complementar n. 157/16 alterou e acrescentou disposições na norma geral do ISS, bem como na lei da improbidade administrativa, passando-se a analisar seu conteúdo relacionado com a tributação da prestação de serviços, observado o ineditismo de suas disposições.

Define que a alíquota mínima do ISS é 2% (dois por cento) sem concessões para a base de cálculo corresponder ao preço do serviço.
Estabelece que o ISS não será objeto de concessão de isenções, incentivos ou benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor que a decorrente da aplicação da alíquota mínima acima referida.

Na hipótese de tomador de serviço localizado em outro município, é nula a lei ou ato que não observe a alíquota mínima.
Caso se verifique a nulidade referida no parágrafo precedente, o Município deve restituir o valor efetivamente pago a título de ISS, “calculado sob a égide da lei nula”, ao prestador do serviço.

Ademais inclui entre as hipóteses de improbidade administrativa qualquer ação ou omissão para conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário que infrinja a alíquota de 2% do ISS acima referida.

Observe-se que para isto ser alcançado é necessário que a base de calculo deva corresponder exatamente ao preço do serviço.
A penalidade fixada na lei de improbidade administrativa consiste na perda da função pública, suspensão dos direitos políticos e multa.

Esta disposição vem sancionar o chamado “privilégio odioso negativo” que, segundo Ricardo Lobo Torres, consiste em isenções e reduções de tributos, que implicam sempre uma concessão contrária à lei geral, considerando privilégio como “a permissão para fazer ou deixar fazer alguma coisa contrária ao direito comum”. As normas jurídicas apresentam-se organicamente ligadas a um sistema que recebe o nome de sistema jurídico, formando uma estrutura.

No Direito Tributário, como expressão do federalismo fiscal, verifica-se uma ordem jurídica nacional, vinte e seis ordens normativas estaduais, um relativa ao Distrito Federal e mais de cinco mil ordens normativas estaduais.

Como se sabe, uma parte significativa das receitas dos Municípios é gerada pelas transferências intergovernamentais e não pela arrecadação de recursos próprios.

A vinculação de um percentual de receita a constantes de obrigações legais para os Municípios, bem como a queda da arrecadação brasileira até para a manutenção das estruturas criadas para execução de tais obrigações têm obrigado os Municípios a exercer de forma mais rigorosa sua competência tributária, embora isto não elimine os conflitos federativos crônicos na divisão dos recursos entre os Estados e Municípios indistintamente.

Dentro deste contexto as peculiaridades de cada Município vão influenciar o exercício de sua competência constitucional.

Como adverte Caio Prado Júnior, em seu clássico História Econômica do Brasil para compreender a administração portuguesa deve-se desconsiderar as noções, hoje pacíficas dos freios e contrapesos, bem como esferas de poder paralelas e diferentes das atividades estatais. Infere-se, assim, que geral, provincial e local não constituem os sinônimos de federal, estadual e municipal respectivamente.

Talvez a tarefa de defender uma racionalidade que satisfaça melhor os interesses da coletividade passa por reconhecer estas peculiaridades históricas, ao invés de rejeitá-las como manifestações de atraso.

Embora possa reconhecer que o Município, até em virtude destes aspectos históricos referidos, conceda isenções ou redução de tributos classificáveis como teratológicas não se autoriza uma vedação genérica de benefícios fiscais, pois ignora o princípio da redução de desigualdades regionais e a notória diferença entre municípios, bem como pretere a competência tributária, atribuída pela CRFB, uma vez ser a isenção uma manifestação desta condicionada constitucionalmente.

O texto normativo tributário, relativo aos benefícios fiscais mormente nos Municípios, requer uma análise sobre o seu fundamento, não se podendo confundir o fundamento da estrita legalidade com a interpretação limitada à compreensão das palavras, sua ordem e modo como se conectam.

Interpretar implica considerar o sentido da norma jurídica, como uma proposição na estrutura do ordenamento municipal, baseada no ordenamento jurídico nacional, passando a ter o Ministério Público um papel mais ativo com o advento da lei complementar n. 157/16. Assim um texto normativo que atribui ao Poder Executivo uma “permissão” para tributar uma situação ofende a estrutura do sistema tributário, uma vez que somente lei pode instituir tributo, segundo o artigo 97 do Código Tributário Nacional, não se podendo camuflar uma isenção com uma permissão ao Poder Executivo começar a tributar quando julgar conveniente.

Neste sentido, ao invés de lamentar ou condenar esta disposição, cabe a proposta de Baruch Espinosa: não ria e não chore, mas compreenda.

E, continuo eu, contribua para superar isto.”

 

Fonte: http://conversandocomoprofessor.com.br/

 

fábiopugliesi*Fábio Pugliesi é advogado em São Paulo e Santa Catarina. Membro do Instituto dos Advogados do Estado de Santa Catarina (IASC). Doutor em Direito, Estado e Sociedade (UFSC), Mestre em Direito Financeiro e Econômico (USP), Especializado em Administração (FGV-SP), autor do livro “Contribuinte e Administração Tributária na Globalização” (Juruá) e professor em cursos de graduação e pós-graduação.

 

 

 

 

 


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